Deito na cama depois de um fim de tarde chato e, digamos, tedioso. Penso em ler meu livro de cabeceira atual. Na verdade, é meu livro de criado-mudo - vulgo bidê - atual. Pego-o na mão e vejo o quão empoeirado está. Ou passou um caminhão carregado de pó dentro do meu quarto, ou já faz alguns dias que o livro está ali - sem ser lido. É outro livro da Tajes, a minha maior diva da escrita. Estou na página 22 - desculpe-me Claudinha, as coisas não têm transcorrido da maneira esperada.
Pego o livro, limpo-o um pouco e começo a leitura. Mas minha mente está em outras rotações, não me permite a leitura. Paro e me pergunto - como faço muito - "Quem sou eu?"
Parece estranho se perguntar isto apenas ao não querer ler o livro naquele momento, mas vai muito além disso. Quem sou eu? Eu sou aquela guria que gosta de ler um pouco de um livro cada noite antes de dormir? Ou eu sou aquele guria que deita e dorme como uma pedra de cansada? Ou ainda eu sou aquela guria que deita com os pais vendo TV na cama deles e volta para a sua já sonolenta e nem um pouco afim de ler um livro? Quem sou eu? Não sei se trata-se de perguntar quem sou eu ou quem eu quero ser. Quero ser tantas coisas, tantas pessoas. Tenho tantas dúvidas de quem sou que não consigo nem mesmo me definir.
Penso que sou uma pessoa extrovertida, comunicativa, falante e alegre. Mas aí o Advogado do Diabo que existe dentro de mim pergunta "Será que tu és assim mesmo? Ou será que é assim que tu te define? Ou os outros te definem? Ou quem tu gostaria de ser? Ou quem tu foi educada para ser?". Quando penso nisso, já não sei mais quem sou nem quem fui. Algumas partes de mim parecem acopladas como próteses e não naturais. Isso sou eu? Será que a "prótese" faz parte de quem eu sou? E se não faz, como eu deixei acoplarem a mim?
Entro em um parafuso mental eterno tentando desesperadamente encontrar algo, uma palavra, uma ação, qualquer coisa que me defina. Nada me define. Nada! Como? Eu já fui mais certa de quem sou, não fui? Não? Sim? Já nem sei mais nada. Pego o chá extremamente doce que meu pai fez há pouco pra mim e coloco a xícara no peito, enquentando-o. A pergunta não cessa "Quem eu sou? Quem sou eu?". Talvez eu não encontre a resposta agora, mas será que eu dia encontrarei? Se são as minha escolhas que me definem, eu escolho quem ser? Se eu for quem eu quero ser eu serei feliz? Por onde começar a ser?
As dúvidas giram tanto que já estão me deixando tonta, mas não sonolenta. Já é quase 1h da manhã e eu quero saber quem eu sou e porque sou. Parece não fazer sentido viver sem saber quem sou. Não quero viver de mentiras nem enganos. Ou quero? O que eu quero? Meu Deus! Estou entrando no parafuso de novo. Acho que eu penso demais em tudo! Isso me define? Será que é isso que sou, uma pessoa que pensa muito? Mas é só isso que sou? Socorro. Quem sou eu?
A angústia aumenta, o barulho do ar condicionado parece cada vez mais alto e atordoante. Quero encontrar uma resposta. Fico pensando que minhas confusões sobre mim mesma começaram naquele ponto que vocês todos se lembram. Eu perdi meu chão e meu céu naquele dia, mas porque? Por que investi tanto naquilo? Agora já nem sei mais quem sou e isso é péssimo. Tomo mais um gole de chá para descer o choro. O que há de errado comigo? Não consigo conter as lágrima, elas atrapalham minha escrita, mas minha mente não para "Quem sou eu? Quem sou eu?". Não sei e já estou quase de saco cheio de perguntar. Quero dormir, mas não tenho sono. Quero não pensar nisso, mas não consigo.
Talvez eu seja uma pessoa que nunca serei no final. Talvez eu seja alguém que tenha que se preocupar em não ser exatamente como se quer para não magoar quem se ama. Talvez. Não sei. Eu queria ser tantas coisas, tantas pessoas. Ah! Eu queria. Mas não sei se sou, se posso ser. Talvez eu deva seguir perguntando e talvez eu só saiba quem eu sou quando eu estiver quase morrendo, reunindo meus fatos e definindo quem eu fui quando não sabia quem era. Talvez ninguém saiba, mas invente sua certeza e seja feliz. Talvez eu seja apenas uma pessoa em uma mudança tão constante que não há um "eu" definido. Talvez. Não sei.
Acho que vou esperar para me definir quando eu estiver morrendo, reunir meus fatos, escolhas, consequências e decisões e então defina quem eu fui. Por enquanto, o que me resta, é continuar perguntando e tentando saber.
Não sei. Talvez isso, afinal, seja eu.
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